O Coletivo DUCA (Departamento Urbano de Comunicação e Arte) está inserido na maior cidade do Distrito Federal, somos jovens periféricos, negros, brancos, homens e mulheres de origens e sexualidades diversas. Falamos de Ceilândia, parida graças à Campanha de Erradicação de Invasões, em 1971. Nas palavras do pedagogo Max Maciel, não se trata de “cidades que se organizam no território”, estamos falando “de estratégias do Estado de retirar a população de determinados lugares e levar para outros”. Removeram os trabalhadores que vieram construir Brasília para regiões distantes, longe 30 km da capital do país.
Falamos
daqui, afastados do centro político, mas cientes da missão de produzir
um documentário pelo projeto “Climas e Territórios”, que vai apontar as
contradições da cidade que nasce dentro da “mais moderna técnica
urbanística”, porém “o plano dos arquitetos” de propor “uma cidade
justa, sem discriminações sociais” e “a medida que o plano se tornava
realidade, os problemas cresciam para além das fronteiras urbanas em que
se procurava conter”, Joaquim Pedro de Andrade no documentário
Brasília: Contradições de uma Cidade Nova, em 1967.
A segregação
planejada que permeia a construção de Brasília, nos distancia do
centro, seja por campanhas idealizadas pelo próprio Estado, seja pelo
alto preço dos imóveis, graças a especulação imobiliária. Ceilândia
surge da retirada de invasões próximas à Brasília. Anos depois, na mesma
cidade, uma migração silenciosa dos próprios moradores dá início ao Sol
Nascente. Hoje, a maior favela da América Latina. Cada vez mais nos
afastam para territórios vulneráveis.
Em
1971, a justificava para a Campanha de Erradicação de Invasões era que
ali não nos cabia. “Os idealizadores de Brasília jamais poderiam
imaginar que os trabalhadores e a classe média poderiam conviver
juntamente”, afirma Max Maciel. Anos depois, em 2012, surge o Setor
Noroeste, localizado em uma área nobre de Brasília, destinado a classe
média alta e vendido como o “primeiro bairro ecológico do Distrito
Federal”, mas dentro de uma terra indígena, conhecida como Santuário dos
Pajés.
O meio ambiente em territórios tão contraditórios
Ivanete
Silva é especialista em educação e meio ambiente, participou da
Campanha de Erradicação de Invasões e mora em Ceilândia há 27 anos. A
luta ambiental da Ivanete vem de “longa data”. Quando o pai muda para
Rondônia, em Porto Velho, conheceu a história de Chico Mendes, “a
questão ambiental no Norte é muito mais forte do que a nossa”, afirma.
Também é idealizadora do projeto Casa da Natureza, no Sol Nascente, onde
dá aulas para crianças da região sobre a importância da preservação do
meio ambiente. A especialista conta como o início de Ceilândia foi
difícil, “tinha muitas crateras e erosões, precisávamos buscar água
ali”.
Para Ivanete, o surgimento de Brasília se deu unicamente pela justificativa do desenvolvimento, mas não pensaram no desenvolvimento sustentável. A especialista vê o Estado como o culpado pela a ausência de políticas habitacionais e ambientais. Agiu, muitas vezes, permissivamente. “Era muito fácil comprar um pedaço de terra em Ceilândia. O Estado sabia que aquela terra não poderia ser vendida, mas ele não fez nada, por quê? Porque quanto mais gente naquele local para ser suporte no período de eleição, é bom para ter voto”, explica a especialista.
Entrevistando a especialista e outros personagens que irão compor nosso documentário, fomos instigados por diversos questionamentos levantados por aqueles que concederam tempo para conversar com o coletivo. Ficamos com as perguntas de Ivanete Silva e são elas que nos guiarão na missão de produzir um material digno de reflexão, que nos dê respostas ou não:
“O que tem de ecológico na construção de prédios?”;
“Quais foram as alternativas que o Estado deu para suprir a degradação ocorrida naquele território (Noroeste)?”;
“O que eles fizeram pelos povos indígenas?”.
Coletivo DUCA na missão. Foto: Ester Trindade/Coletivo DUCA